CONVIVÊNCIA DEMOCRÁTICA E EDUCAÇÃO: A CONSTRUÇÃO DE RELAÇÕES E ESPAÇOS
DEMOCRÁTICOS NO ÂMBITO ESCOLAR
Segundo
a autora Valéria Amorim (2007, p. 59) o texto referente a temática acima pretende
promover reflexões e apontar caminhos pedagógicos para a construção de relações
interpessoais democráticas no convívio escolar, porém a autora ressalta que
essas resoluções tem sua base no diálogo e na resolução pacífica de conflitos. O texto busca descrever possíveis condições
para a construção de valores democráticos que auxiliem na transformação das
relações sociais, de forma a atingirmos a justiça social e o aprendizado da
participação cidadã nos destinos da sociedade.
A partir disso, esta analise será comparativa, pois pretende confrontar as ideias da autora com a realidade observada em sala de aula pelo acadêmico de Pedagogia durante observação em campo de estágio curricular supervisionado vivenciado durante a graduação, porém a realidade da sala de aula deixa essas ideias ainda mais intangíveis se analisada comparativamente por um professor que já exerce a função e conhece a vivência democrática e suas relações com o espaço escolar.
COMPARAÇÃO ENTRE AS IDEIAS DE ¹VALÉRIA AMORIM ARANTES E A REALIDADE OBSERVADA
EM CAMPO DE ESTÁGIO
A
autora Valéria Amorim, (2007, p. 59), inicia a discussão do tema reportando-se
a uma citação de Ashley Montagu (1978), “nenhum ser humano nasce com impulsos
agressivos ou hostis e nenhum se torna agressivo ou hostil sem aprendê-lo” esse
ponto de vista, por sua vez, é totalmente aceito e uma boa escolha para propor
a discussão de um tema tão abrangente, afinal umas das primeiras concepções que
devemos ter em mente é que o ser humano como ser social sofre influencia do
meio em que vive, nesse caso, ninguém escolhe relacionar-se de forma
conflitante, a sociedade é quem impõe esse conflito por meio de sistemas de
interesses diversos, nesse caso, analisaremos os
¹ Professora da Faculdade de Educação da
Universidade de São Paulo. Autora do texto “Convivência democrática e educação:
a construção de relações e espaços democráticos no âmbito escolar”.
conflitos que ocorrem no âmbito escolar com
respeito às vivências, as relações e a resolução desses conflitos de forma
dialética e tranquila.
A resolução de
conflitos como ferramenta de constituição psicológica e social
Entender
a existência dos conflitos como um processo natural de cada indivíduo é o
primeiro passo para estabelecer relações, afinal, como enfatiza a autora, cada
pessoa é construída com outra, seja de forma direta ou a partir da vivência, é desse
modo que percebemos a existência da grande diversidade e distintas relações
existentes entre os seres humanos.
O conflito é uma
parte natural de nossas vidas. A maioria das teorias interacionistas em
filosofia, psicologia e educação está alicerçada no pressuposto de que nos
constituímos e somos constituídos, a partir da relação direta ou mediada com o
outro. Nessa relação, nos deparamos com as diferenças e semelhanças que nos
obrigam a comparar, descobrir, ressignificar, compreender, agir, buscar
alternativas e refletir sobre nós mesmos e sobre os demais. O conflito
torna-se, portanto, a matéria-prima para nossa constituição psíquica,
cognitiva, afetiva, ideológica e social. (AMORIM, 2007, p. 59).
Dessa
forma se existem grandes diferenças de um indivíduo para o outro, a comparação
entre essas peculiaridades acaba acontecendo, e não só sob esse olhar, mas
também na busca de entender outros significados, as ações e principalmente a
reflexão sobre todos os envolvidos, assim o conflito é algo normal e comum no
cotidiano. O diferencial, no entanto,
está na resolução desse conflito que se mostra muitas vezes algo cansativo,
pois para compreender, descobrir, ressignificar, é preciso que nossas ideias
sejam deixadas de lado durante a resolução, porém durante campo de estágio
percebemos que existem grandes contradições sobre essa perceptiva.
O
quadro abaixo representa como deveria ser a resolução satisfatória de um
conflito e como tem sido observada na sala de aula:
Ilustração 2: Postura
ideal X postura usual
POSTURA IDEAL PARA
RESOLUÇÃO DE CONFLITO
|
POSTURA USUAL PARA
RESOLUÇÃO DE
CONFLITO
|
Afastamento
do próprio
ponto de vista;
|
Aproximação
do seu ponto de vista como verdade absoluta;
|
Contemplação
de outros pontos de vista diferentes;
|
Recusa
a ver outros pontos de vista diferentes;
|
Pontos
de vistas opostos aos nossos.
|
Aceitação
somente aos próprios pontos de vista.
|
Autora: Valdineia Barreto, 2013.2.
Fonte: Elaboração própria.
Essa postura, todavia, acontece parcialmente
no espaço escolar, e a resolução desses conflitos exige muito criatividade “Exige-nos,
ainda, a elaboração de fusões criativas entre os diferentes pontos de vista.
Tal processo implica, necessariamente, operações de reciprocidade e síntese
entre as diferenças”. (AMORIM, 2007, p. 60).
Ilustração 3:
Sínteses das ações ideais e usuais
Autora: Valdineia Barreto, 2013.2. Fonte: Elaboração
própria.
A
ideia propagada no texto mostra qual seriam as sínteses que permitem que os
conflitos requerem para serem resolvidos de maneira satisfatória para os envolvidos,
porém como afirma a autora Valéria Amorim (2007, p. 60), “Tudo isso requer um
processo de aprendizagem que nosso sistema educativo parece não contemplar”.
A
formação acessível durante a graduação visa à construção de valores de
democracia e de cidadania, assim obviamente, não pode ignorar os conflitos
pessoais e sociais vividos pelas pessoas envolvidas, isso faz surgir o seguinte
o questionamento: Será que os cursos de graduação não preparam o futuro
pedagogo para trabalhar a democracia e cidadania, ou estes durante a saída da
instituição de Ensino e ingresso no sistema escolar não valorizam as relações
interpessoais e optam por lidar com esses conflitos de forma que a o respeito a
diferença de um indivíduo para o outro, norteie suas ações?
Após
analisar essa perspectiva, faz-se necessária a compreensões de novos paradigmas que surgem propondo a
resolução desses conflitos, porém, nesse caso, essas ações se baseiam na
comunicação e em práticas discursivas capazes de transformar o espaço escolar.
Tais propostas
rechaçam a ideia de que em um conflito sempre há ganhadores e perdedores e
defendem a construção de interesses comuns e uma coparticipação responsável.
Incrementando o diálogo e a participação coletiva em decisões e acordos participativos.
(AMORIM, 2007, p. 21).
A
partir dessa analise, vejamos o que essas propostas permitem caso sejam
adotadas durante a prática cotidiana no espaço escolar e nas relações com o
meio:
Ilustração 4: Contribuições
de propostas
Autora: Valdineia Barreto, 2013.2. Fonte: Elaboração
própria.
Os conflitos são um
mal necessário, e não podem ser visto na sociedade de forma negativa, nem como
algo que levará o ser humano a destruição, em alguns casos o conflitos ao invés
de ser solucionado deve deixar de existir, “[...], por exemplo, entre dois
irmãos, ou entre duas irmãs, a conduta do pai ou da mãe, normalmente, contempla
a ideia de que o extinguir é a melhor forma de resolvê-lo”. (AMORIM,
2007, p. 62). No sentido proposto pela autora, significa que o melhor é que
façam “as pazes” e voltem a ser amigos (as), como eram antes de ocorrer esse
conflito, “Em suma, o conflito é visto como algo desnecessário, que viola as
normas sociais e que, portanto, deve ser evitado” (AMORIM, 2007, p. 62).
Durante observação em
campo de estágio percebemos que o currículo escolar, por exemplo, que conforme
cita a autora encoraja a uma reorganização para trabalhar esse currículo,
mostra-se muitas vezes apenas como um discurso, mas na prática, os conteúdos
transversais, por si só não, se trabalhem os conflitos vividos no cotidiano.
Resumindo, com este
tipo de proposta educacional, a escola entende que, da mesma forma que os
estudantes aprendem a somar, a conhecer a natureza e a se apropriar da escrita,
é fundamental para suas vidas que conheçam a si mesmos e a seus colegas, e as
causas e consequências dos conflitos cotidianos. Trabalhando dessa maneira, por
meio de situações que solicitem a resolução de conflitos, a educação atinge o
duplo objetivo de preparar alunos e alunas para a vida cotidiana, ao mesmo
tempo que não fragmenta as dimensões cognitiva e afetiva no trabalho com as
disciplinas curriculares.
(AMORIM, 2007, p. 63).
Dessa forma é
possível perceber que o objetivo da escola, não é somente que o aluno aprenda a
somar, ler, escrever, interpretar, mas que essas aptidões façam sentido em seu dia-a-dia,
e que ao deparo com situações que representem qualquer tipo de conflito, este possa
atingir outro nível da educação, o nível que prepara o educando para a vida
cotidiana.
As assembleias escolares e o convívio democrático
É
um momento organizado para que alunos e alunas, professores e professoras
possam falar das questões que lhes pareçam pertinentes para melhorar o trabalho
e a convivência escolar, porém observou-se que na escola, não há um
compartilhamento mais completo, a diferenças não são explicitadas ou
trabalhadas regularmente, são estas feitas apenas parcialmente.
ÉTICA, CIDADANIA E EDUCAÇÃO: ESCOLA, DEMOCRACIA E CIDADANIA
A discussão proposta pelos autores Lucia
Helena Lodi¹ Ulisses F. Araújo² afirmam que aprender a ser cidadão e a ser
cidadã requer que o individuo aprenda valores que sem os quais essa postura não
seria possível. Será que de fato a escola ensina esses valores? Essa pergunta
uma vez ou outra coloca alguns aspectos em que muda esse questionamento: será
que é a escola que cabe ensinar esses valores?
Existe
uma longa discussão sobre as finalidades da educação, afinal umas das
concepções que permeiam essa perspectiva é que a escola possui o dever de
ensinar e não de educar, esta segunda tarefa é dever da família. Todavia, a
responsabilidade pela formação de cidadãos críticos, reflexivos e participantes
ativos em sociedade são deveres da escola, assim propomos a analise comparando
o que o individuo deve aprender para se comprometer com o que acontece na vida coletiva
da comunidade e do país e como temos observado não só alguns comportamentos
contrários, em sala de aula durante campo de estágio:
Ilustração 5: Aprendizagens
e condutas comuns
Autora: Valdineia Barreto, 2013.2. Fonte: Elaboração
própria.
¹Diretora do Departamento de Políticas do
Ensino Médio – Ministério da Educação. ² Professor da Escola de Artes, Ciências
e Humanidades da Universidade de São Paulo (USP Leste).
Para
que os estudantes possam aprender e assumir os princípios éticos, são
necessários pelo menos dois fatores, (LODI apud ARAÚJO, p. 69). Assim façamos a seguinte analise comparando
esses dois fatores com a realidade observada na escola:
Ilustração 6: Princípios
e suas finalidades
PRINCÍPIOS
|
FINALIDADES
|
Expressar
em situações reais.
|
Para
ter experiências que possam conviver com a sua prática.
|
Capacidade
de autonomia moral.
|
Para
adquirir a capacidade de analisar e eleger valores para si, consciente e
livremente.
|
REALIDADE NA ESCOLA
|
|
Tanto
os princípios, quanto as finalidades destes são desenvolvidas no âmbito
escolar, apenas parcialmente.
|
Autora: Valdineia Barreto, 2013.2.
Fonte: Elaboração própria.
Um
detalhe importante é que durante o ensino e aprendizagem, o indivíduo deve
exercer papel ativo como sujeito da aprendizagem, sejam estudantes ou docentes,
todos precisam compreender e interpretar o sentido que os conteúdos com os
quais tem contato na escola. Aprender por quê? Para que? Para que serve esse
conteúdo? Porque esse e não aquele assunto?
Infelizmente,
na realidade da escola, essa participação se dá de forma passiva, e nem sempre
o aluno ou professor entende a finalidade de um ou de outro conteúdo, este é
repassado aos alunos que não o associam a sua vivência ou sequer entendem o
porquê deste lhe estar sendo proposto, muitas vezes a impressão que fica é que
alguns conhecimentos são impostos, uma vez que o aluno não opta por obter ou
não informações suficientes para compreender sua promoção:
[...] a promoção de uma educação em valores
deve partir de temáticas significativas do ponto de vista ético propiciando
condições para que os alunos e as alunas desenvolvam sua capacidade dialógica,
tomem consciência de seus próprios sentimentos e emoções (e dos sentimentos das
demais pessoas) e desenvolvam a capacidade autônoma de tomada de decisão em
situações conflitantes do ponto de vista ético/moral. (LODI apud ARAÚJO, p.
69).
Muito
se fala em autonomia, mas o ensino proposto na sala deu aula, muitas vezes
impede que esta se desenvolva, afinal ao invés de incentivar a criatividade, os
conteúdos, assim como as atividades são apenas a efeito de memorização.
Percebemos
durante campo de estágio que alguns professores não adquirem ideias que os
façam compreender o papel da escola na construção da democracia e da cidadania,
isso de certa forma prejudica o aluno em seu processo de formação como cidadão.
Vejamos alguns exemplos citados do livro: Educação: um tesouro a descobrir:
Ilustração 7: As
ideias e a realidade na sala de aula.
IDEIAS
|
REALIDADE
|
As escolas devem evocar princípios como
respeito mútuo, solidariedade, justiça e diálogo e em que os alunos e as
alunas.
|
O espaço escolar muitas vezes representa um
processo de exclusão, rejeição as diferenças, individualismo, violência,
injustiças e sem respeito.
|
Os educadores devem sempre estar atentos à
coerência entre o discurso e a ação: respeitar para ser respeitado, assumir e
cumprir suas responsabilidades.
|
Não tem sido observada essa postura de
maneira satisfatória. Alguns professores raramente vivem o que ensina, e nem
sempre cumprem com sua função na sala de aula.
|
Participação dos estudantes na escola e na
comunidade ajuda a formar seu caráter como cidadão e como cidadã.
|
Raramente acontece, ou observamos que esta se
caracteriza como insuficiente para que o indivíduo participe mais ativamente.
|
Autora: Valdineia Barreto, 2013.2.
Fonte: Elaboração própria.
3.1 O PROGRAMA ÉTICA E CIDADANIA
Lodi
apud Araújo (p. 69), o Programa Ética e Cidadania deve ser visto como um
projeto pelo qual a comunidade escolar pode:
Iniciar, retomar ou
aprofundar ações educativas que levem à formação ética e moral de todos os
membros que atuam nas instituições escolares. Dessa forma, o trabalho com ética
e cidadania nas escolas pressupõe intervenções focando quatro grandes eixos, ou
módulos, independentes, mas com nítida inter-relação entre eles: Ética;
Convivência democrática; Direitos Humanos; e Inclusão Social. (LODI apud
ARAÚJO, p. 69).
Assim
a moral e ética deve estar sempre ligada com todos os membros que atuam nas
escolas e não somente na sala de aula.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRAFICAS
MONTAGU,
A. La naturaleza de la agresividad
humana. Madrid: Alianza, 1978.
PUIG,
J. M.; MARTÍN, X; ESCARDÍBUL, S; NOVELLA, A. Democracia e participação escolar: Propostas de atividades. São
Paulo: Moderna, 2000.
Lodi,
L.H; Araújo. U. F. Ética, cidadania e
educação: escola, democracia e cidadania. Brasília: Ministério da
Educação, Secretaria de Educação Básica, 2007.
BRASIL.
Ética e cidadania: construindo
valores na escola e na sociedade/Secretaria de Educação Básica, Fundo Nacional
de Desenvolvimento da Educação. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de
Educação Básica, 2007.
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