Autora: Sonia
Meire Santos Azevedo de Jesus
Entramos
no século XXI com mais incertezas do que certezas do presente e, muito mais
incerteza do que vem a ser o futuro que estamos construindo no presente. Às
vezes, temos a sensação que não saímos do passado, pois, ao mesmo tempo que ele
se tornou distante, está muito mais perto, principalmente, quando observamos
práticas coloniais, a exemplo do trabalho escravo existente, ainda hoje no
país.
Também
é verdade, que o presente parece muito mais distante porque os problemas da
humanidade, que acompanham as lutas do presente, não parecem possíveis de ter
saídas. E o futuro? Estamos com o olho no futuro, mas os nossos pés ainda pisam
na sombra do passado. Quando essa sombra alimenta as nossas utopias para que
possamos agir no presente e transformar o mundo em que vivemos, ela é de fato
construtiva, mas quando ela nos aprisiona, corremos os riscos de só sermos
reconhecidos como vítimas de um passado que não deixou de existir e, de um
presente imobilizador.
Tomo
estas reflexões para me referir aos modelos de racionalidade que acompanham as
certezas e incertezas do presente e do futuro, como uma reflexão importante que
poderá subsidiar uma autorreflexão das nossas práticas, das nossas crenças e
utopias, pois, parto do pressuposto de que todo o conhecimento que construímos
na luta e na resistência, também comporta incertezas e ignorâncias.
Doutora
em Educação e professora-pesquisadora da Universidade Federal de Sergipe.
Membro da Comissão Pedagógica Nacional do Pronera. As múltiplas
inteligibilidades na produção dos conhecimentos, práticas sociais e estratégias
de inclusão e participação dos movimentos sociais e sindicais do campo. Essa é
uma das razões, talvez, a maior razão, que nos une neste encontro. Como pesquisadores
e militantes podemos fazer juntos, reflexões sobre as práticas e sobre o
conhecimento que funda essas práticas.
Para
isso, convido todos a uma conversa, a partir de uma análise, ainda que parcial
e provisória, sobre o que os movimentos sociais e sindicais têm produzido pedagogicamente,
na luta por uma Educação do Campo, e, explico que assumo uma postura em relação
a este encontro, para mim, neste espaço não há lugar para convencimentos sobre
teorias ou métodos, mas o nosso objetivo é a construção de uma compreensão
mútua da realidade camponesa a partir da Educação do Campo, a partir dos
diferentes sentidos, teorias, contextos, projetos e utopias.
Essa
compreensão exige um modo de pensar muito mais relacional do que dual entre
sujeito/objeto; natureza/cultura; homem/mulher; campo/cidade; rural/urbano; conhecimento
acadêmico/conhecimento não acadêmico, entre outros.
A
compreensão mútua também exige, um exercício crítico às formas de racionalidade
que fundam as práticas sociais dos movimentos, incluindo nelas a nossa participação
na construção dessas práticas, como também, um exercício crítico sobre a nossa
postura e sobre o conhecimento que produzimos.
Neste
sentido, e em função do tempo que tenho para iniciar uma conversa sobre as
muitas racionalidades existentes na produção pedagógica dos movimentos sociais
e sindicais, elegi aquela que está presente diretamente no princípio da luta
por uma Educação do Campo: a universalização do direito.
Essa
educação tem na sua origem a necessidade de reinventar as práticas sociais,
contra um processo perverso de uma forma hegemônica de globalização econômica,
política e cultural que impõe aos diferentes países periféricos e
semiperiféricos, a reorganização das formas de poder, de produção do
conhecimento, e de desenvolvimento econômico e social, que aumenta
assustadoramente a perda das autonomias e as desigualdades, em especial, entre
o povo brasileiro que vive no campo ou é, excluído dele. Portanto, trata aqui de analisar as
práticas pedagógicas que trazem na sua origem a vinculação com um Projeto de
Nação, da construção de um projeto de futuro, mais próspero e solidário, em que
a cultura camponesa, seja o elo fundamental para a construção da justiça
social, de novos modelos de desenvolvimento de base solidária, de soberania e
de democracia ampliada.
Para
tanto, o princípio da universalização que funda as lutas dos movimentos sociais,
como também funda muitas das nossas utopias, resgata da racionalidade do
pensamento liberal, a idéia de que a sociedade possui não só deveres, direitos,
e, a partir deste princípio, os movimentos sociais produzem a sua existência política
pelos ideários da igualdade, da participação e dos métodos de organização.
A
compreensão desses ideários e da materialização na luta e no fortalecimento da autonomia
dos próprios movimentos, não pode ser vista isoladamente, somente por uma
inter-relação é possível identificar as formas de reorganização e produção de
conhecimento, de poder e de direito em cada um deles.
Ainda
que eu faça uma exposição muito superficial, ressalto alguns aspectos que estão
fortemente imbricados na forma de produção dos conhecimentos, de poder e de direito
dos movimentos sociais. Em relação aos conhecimentos, os movimentos partem da
ideia de que é direito de todos e todas, tanto a apreensão do que tem sido
historicamente produzido pela ciência, quanto o reconhecimento do que os
próprios movimentos produzem nos diferentes contextos.
No
que diz respeito às formas de organização política e social, os movimentos aspiram
a uma sociedade em que os interesses individuais se voltem para os interesses coletivos
como condição de emancipação de uma coletividade, respeitando as diferenças e a
diversidade das ideias. O poder partilhado é um dos objetivos desse processo de
organização.
A
coletividade somente pode emancipar-se, se houver uma pluralidade de projetos
políticos. Não é possível pensar uma sociedade igualitária e justa, se um
movimento, ou partido, ou um grupo exercer o poder hegemônico sobre os demais,
ainda que nem todos tenham consciência desse aspecto, na realidade, os movimentos,
muitas vezes não conseguem se entender, pela pluralidade dos projetos, mas
reconhecem que se não fosse essa pluralidade não haveria oxigenação da política
como um todo.
Essas
formas de produção do conhecimento, de poder e de direito, estão diretamente relacionadas
à construção dos paradigmas da Educação do Campo.
É
a partir dessa relação que procedo uma análise da produção pedagógica dos
movimentos sociais e sindicais na Educação do Campo. Essas formas se relacionam
com o: reconhecimento dos conhecimentos e saberes produzidos pelos sujeitos do
campo e a sua reatualização com outros conhecimentos, incluindo os técnicos e
científicos.
O
segundo com a organização do trabalho pedagógico, e, o terceiro com a
pluralidade de projetos educacionais. Reconhecimento dos conhecimentos e saberes
produzidos pelos sujeitos do campo e a sua reatualização com outros
conhecimentos, bem como a compreensão de outras formas de produção do
conhecimento científico.
Os
programas educativos oficiais, não podem continuar contribuindo para a descaracterização
da cultura camponesa, principalmente, o modo de organização social e as suas
formas de resistência no campo. Essa discussão nos remete à igualdade como um
princípio a ser defendido, quando o sistema capitalista e latifundista do
campo, utiliza-se deste, para incluir os camponeses, de forma inferiorizada e
subordinada à lógica do capital sob o argumento niilista, de que para eles, não
há saídas, a não ser pela sua incorporação a um único modelo de desenvolvimento.
Essa
lógica se fortalece também, pela visão determinista do fim do campesinato na
sociedade contemporânea. Para essa lógica, não faz sentido construir escolas no
campo, pensar em metodologias específicas, alterar as relações de poder.
Nas
práticas educativas essas lógicas se conflituam, porque a compreensão iluminista
e racionalista dos processos formativos e de construção do conhecimento, não
conseguem dar conta da dinâmica social que é o campo brasileiro, primeiro,
porque não reconhece o campo com esses sujeitos, segundo porque, quando os
identifica, trata-os como fragmentos/objetos de um campo ao qual só cabe as
grandes relações econômicas, terceiro, porque ignora os desejos, os direitos,
as histórias e, em nome do desenvolvimento economicamente produtivo ao capital,
para aqueles que conseguem chegar à escola, cabe a ênfase a um desenvolvimento
técnico instrumental na sua formação.
Esta
lógica instrumental se dissemina em detrimento da construção do conhecimento em
que o fazer não pode estar dissociado, do construir e do avaliar. Para os
camponeses(as) esta relação do saber-fazer-saber, pode contribuir para restituir
as possibilidades dos sujeitos produzirem e avaliarem os seus saberes, conhecimentos
e práticas sociais de modo intencional, não ingênuo e crítico.
A
relação saber-fazer-saber dos(as) camponeses(as), exige uma reflexão profunda sobre
o modo de produção do conhecimento, das epistemologias ou inteligibilidades em
curso no campo. Há necessidades práticas da vida cotidiana como a soberania
alimentar, os problemas da falta de água, dos solos, das sociabilidades, da
organização do trabalho de jovens e mulheres, da assistência técnica, entre outros,
que necessitam de uma avaliação constante do que está disponível na sociedade e
do que deve ser recriado, ou ressignificado.
A
ressignificação do conhecimento não pode ser uma linha de mão única, mas, deve
acontecer, em função do contexto onde se produz e esse contexto comporta, tanto
o que é produzido cientificamente, quanto o que é produzido pelos saberes não-acadêmicos,
por vias e por situações diferentes.
Um dos fundamentos das práticas
pedagógicas dos movimentos está na metodologia e nos seus processos. As
metodologias interdisciplinares estão subsidiando os movimentos a ampliar a
compreensão a partir dos diversos campos do saber.
Sem
negar as especificidades dos campos científicos, não reduz toda explicação a eles.
Compreende-se que o processo de apreensão e produção do conhecimento não pode
ser atomizado, homogeneizado e particularizado.
A
recuperação da temporalidade da produção econômica, por exemplo, também exige
formas de organização do trabalho, métodos, tecnologias, recuperação dos
saberes, reconhecimento das diferenças de geração e gênero, entre outros.
A
recuperação das temporalidades dos sujeitos é fundamental para o enfrentamento da
lógica produtivista do capitalismo. Por sua vez, os(as) camponeses(as) têm
feito uma leitura crítica da utilização das técnicas e tecnologias,
principalmente, uma preocupação com a criação ou socialização das novas matrizes
tecnológicas que contribuam para um desenvolvimento socialmente justo e
ecologicamente sustentável no campo. Analisar os seus usos e consequências
ambientais, políticas, sociais, tem sido fundamental para a construção desse
modelo.
Os
movimentos entendem que o território possui uma complexidade, porque a sua
essência está imbricada em um tecido de problemas inseparáveis e, as técnicas e
tecnologias, seus usos e funções e sua relação com a organização do trabalho, a
inclusão social e o meio ambiente devem estar em comunicação e sendo motivo de
reflexão crítica durante todo o processo de formação.
No
entanto, os movimentos têm sentido muitas dificuldades para uma reflexão crítica
e para a produção de alternativas ao modelo capitalista. Essas dificuldades residem,
na falta de inteligibilidade das seguintes questões:
Compreensão das diferentes formas de
produção do conhecimento por parte das práticas sociais entre os próprios
movimentos sociais do campo. Essa inteligibilidade é fundamental para a unidade
dos projetos políticos); a existência de lógicas diferenciadas na produção e
apreensão do conhecimento
é algo, que necessita ser trabalhado.
Isto também vale para as universidades. Nenhum
conhecimento pode ser entendido como superior ao outro; dificuldades para
superar as relações de poder que os excluem como sujeitos capazes de produzir
conhecimentos por lógicas diferenciadas. Neste caso há necessidade de refletir
sobre quem controla a produção do conhecimento, quem produz? Em que condições
produz? Quem financia a produção? Quem disponibiliza? Quem tem o poder de
legitimá-los? Qual o papel da pesquisa, das agências de fomento e dos pesquisadores
na construção dessa inteligibilidade?
1.
A organização do trabalho pedagógico
A
produção pedagógica dos movimentos sociais aponta para uma educação que reforce
os princípios da liberdade, das autonomias dos sujeitos, da construção de
condições democráticas e solidárias, compreendendo o campo como o lugar do
pensar diverso, do exercício de saberes e de temporalidades, da resistência, do
compartilhamento de sonhos e utopias, de recriação de pertenças e identidades, da
valorização e emergência da cultura camponesa .
Essa
produção está no cerne do processo de construção de um projeto político e
pedagógico a partir dos seus sujeitos, que tem sentimentos, desejos, rostos, histórias
de vida e de luta, a partir da realidade particular dos camponeses, que é a sua
materialidade de vida, a situação de pobreza em que muitos se encontram, a
ausência de políticas públicas de saúde, de moradia, de educação, a ausência de
políticas nacionais e regionais articuladas a um modelo de desenvolvimento que eleve
as condições de vida desses camponeses, e do campo como um todo, sem destruir
seus vínculos de pertença com a terra, a floresta, as águas.
Por
fim, a organização do trabalho pedagógico necessita da compreensão do significado
da organização dos sujeitos por coletivos sociais. Nesses coletivos há possibilidades
do exercício de uma formação humana menos individualista e que projete ações
pensando, não somente, no crescimento de cada um, mas principalmente, como os
sujeitos coletivamente, podem implementar um projeto do campo articulando a
educação com este projeto.
A produção pedagógica dos movimentos aponta
para um diálogo entre teoria pedagógica e prática em que o projeto educativo
não pode estar dissociado de um projeto político, social.
A
inteligibilidade desse projeto passa pela compreensão: Das resistências que
hoje são exercitadas pelos diferentes sujeitos do campo no enfrentamento à
lógica capitalista que conduz ao individualismo, à lógica do “salve-se quem
puder” (os modelos de desenvolvimento colocado hoje para os trabalhadores, a
exemplo da carcinicultura no Nordeste, da fruticultura irrigada para exportação
que expropriam o trabalho e as reservas ambientais, têm produzido atitudes
individualistas).
No
entanto, há resistências e não há uma clareza dessas resistências no conjunto
dos movimentos sociais e sindicais do campo, inclusive, em relação à educação,
em que os projetos educativos estão contribuindo para criar essas resistênicas;
se há uma defesa de construção coletiva, há também defesa de princípios e, a
partir deles, os sujeitos podem se sentir incluídos ou excluídos. A inclusão ou
exclusão nem sempre passa por vontades e desejos individuais, mas são
determinadas por relações de poder que controlam a dinâmica dos coletivos
sociais.
O
que está dando certo e o que não está contribuindo para avançar nas relações de
poder, a fim de transformá-los em relações de autoridade partilhada? Como fazer
o exercício de autoridade partilhada nas relações com a rede pública de ensino
que ignora os sujeitos como capazes para fazer a gestão educacional, para
planejar
Esse
paralelo foi construído para trabalhar com os professores do I Encontro da
Região Nordeste do Programa de Educação do Campo e Formação e Qualificação para
a Assistência Técnica e Extensão Rural – Residência Agrária/MDA/INCRA,
realizado em Aracaju, Sergipe, nos dias 29 e 30/06 e 01/07/2005. e executar os
projetos político-pedagógicos? Existem experiências inovadoras? Como podem
emergir?
Das
correntes teóricas que subsidiam as diferentes práticas pedagógicas e formas de
organização do trabalho. Há orientações dos movimentos sociais e sindicais, no
que diz respeito às opções, mas saber de fato o que está acontecendo, as multiplicidades
de práticas com diferentes concepções teóricas, não é algo fácil, principalmente,
se considerarmos a imensidão de projetos pedagógicos em curso.
Isto
é importante, porque estamos falando da relação entre educação e projeto de
campo e de sociedade. Pode-se estar falando de projetos pedagógicos que contribuam
para a emancipação e, na prática estar se produzindo práticas pouco emancipatórias?
Identifica-se as dificuldades dos movimentos e
das próprias universidades para construir propostas que tragam como referência
a vida dos camponeses e todas as contradições. Saber quem está fazendo o que,
com quais estratégias, referenciais, necessita de um trabalho de escavação.
Na
medida em que essas práticas, quando inseridas nas políticas públicas estatais
e estas têm profundas dificuldades para traduzir as necessidades, por razões
diversas que não cabem ser esclarecidas nesse momento, pergunta-se: o que cabe
aos pesquisadores na construção dessas inteligibilidades?
Existem
espaços alternativos de produção desta gestão? Como elas têm acontecido? Em
caso positivo, pode-se estender como referência aos demais?
2.
A pluralidade dos projetos educacionais
Um
outro desafio assumido pelos movimentos sociais e sindicais no avanço da luta política
está na unidade de luta estratégica entre as classes sociais do campo sem perder
de vista a diversidade que compõe as classes sociais ou frações de classe.
Essa
diversidade é fundamental para a emancipação social, pois quanto mais houver a
pluralidade de projetos coletivos, mais aumentam as possibilidades de alternativas
ao capitalismo. No entanto, esses projetos precisam se articular de modo não
hierárquico em função de objetivos comuns. Do
ponto de vista do conhecimento que os fundamenta, não podemos cair na armadilha
de que uma teoria geral irá dar conta da aproximação da realidade. Por isso,
nem uma teoria política nem pedagógica pode dar conta da heterogeneidade que há
no campo.
Quanto
mais os espaços estiverem sendo reordenados pelos camponeses, com uma maior
heterogeneidade e pluralidade de projetos, mais possibilidades teremos de
construir uma sociedade diferente da que temos hoje.
A
formação dos sujeitos não poderá ser fragmentada, homogeneizada, particularizada
demais. Os sujeitos serão obrigados a reconhecer as complexas relações que
engendram a sua vida e a reflexão sobre os conhecimentos que a sustentam em um
território epistemológico e social.
Desse
modo a Educação do Campo para ser coerente com um projeto popular para o país,
uma educação comprometida com esse projeto e com um modelo contra-hegemônico de
desenvolvimento, necessita também da pluralidade dos projetos educacionais e
esta, somente pode ser construída, se tivermos clareza do que significa para os
camponeses o princípio da universalidade.
Inicialmente,
quero ressaltar que, como princípio, o direito universal não pode ser
confundido com o universalismo que está presente na estrutura do modelo de desenvolvimento
excludente do capital, cuja inteligibilidade parte do pressuposto que este é, a
única forma possível de viver no mundo. A mesma que negligencia as possibilidades
de relações não subordinadas entre o campo e a cidade.
A
crítica ao universalismo põe em causa a cidade, como a referência para o campo.
Afirmo também que o universal não deve negligenciar a heterogeneidade dos sujeitos
que vivem no campo.
Para
os camponeses, a luta pela educação como direito universal não é uma questão
apenas de acesso, de ter o direito a estudar, a se organizar, mas o direito a
serem reconhecidos com sujeitos que produzem conhecimentos, que possuem
práticas diferentes na organização do trabalho e da cultura camponesa, não
necessariamente, às mesmas engessadas pelo capitalismo, embora, muitas delas,
estejam fortemente influenciadas por ele. Abre, portanto,espaço para o
reconhecimento da diferença, bem como a sua problematização.
Por
sua vez, o reconhecimento da diferença, também não pode ser confundido com a
valorização da fragmentação, da pluralidade da proliferação das periferias que
ocultam a relação desigual, central no capitalismo, muito celebrada por algumas
correntes teóricas contemporâneas.
Muito
menos, cair numa explicação relativista dessas diferenças que, se por um lado,
conduz para a sua naturalização, por outro, legitima as desigualdades. A
diferença necessita ser problematizada porque ela é fruto dessas desigualdades,
e, ao ser problematizada, necessita ser reconhecida na Educação do Campo pelo que ela emancipa e pelo que ela
legitima na promoção da desigualdade. Por essa razão, é que o direito universal
da educação na reivindicação dos movimentos sociais e sindicais do campo, no âmbito
das Políticas Públicas, não é algo tão simples, tendo em vista que, se há
diferentes projetos, parece não haver uma inteligibilidade completa destes.
Parece ser fundamental ter clareza desses projetos para produzir conhecimentos
e práticas que contribuam para o avanço político e social dos movimentos e da
política educacional.
De
que forma poderemos construir essa inteligibilidade, principalmente, no momento
de crise política que estamos vivendo e quando, os próprios intelectuais, assim
como os movimentos sociais, não têm clareza dos diferentes projetos em curso?
Acredito
que não podemos discutir a pesquisa em Educação do Campo que, por sua vez, está
relacionada diretamente com as diferentes formas de conhecimento, de poder e de
direito constituintes das instituições em que trabalhamos e dos movimentos
sociais do campo. Penso que, para construir essas inteligibilidades, necessitamos
reforçar os espaços onde atuamos, mas também, criar espaços alternativos de
construção dessas inteligibilidades mútuas, pois as nossas universidades, por
mais contribuições que possam fazer, da forma que estão estruturadas, estão
muito longe da construção destas inteligibilidades, pois essas necessitam de linguagens
(música, língua, relações corporais, entre outras), estruturas, metodologias que
permitam construir diálogos sem que ninguém imponha a sua forma de
interpretação sobre a linguagem do outro.
Poderemos
a partir deste encontro pensar nessas formas alternativas de produção do
conhecimento, sem abrir mão dos nossos espaços tradicionais de produção? Se
sim, como alargá-los? Decerto, os que aqui estão, poderão discordar,
acrescentar, ou até mesmo rejeitar estas questões, mas creio que, no mínimo,
elas podem funcionar como uma provocação para pensarmos propositivamente um
diálogo entre o que fazemos ea reflexão sobre o que fazemos, neste tempo
histórico e tão difícil, porque estamos sentindo na pele a incerteza do
presente, o que nos obriga a estabelecer talvez, algumas fortes radicalizações
com este presente.
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